RECLAMAR POR QUÊ? RECLAMAR DE QUÊ?
De repente fiquei irritado (como vocês às vezes ficam) por não conseguir acessar a internet - essa tralha que nos deixa dependentes de suas vontades.
Aconteceu anteontem. Eu estava cheio de ideias; amanheci cheio de assuntos para desenvolver em crônicas, mas deixei para a tarde; aí, quando fui me plugar (termo antipático!), havia ameaça de vírus.
Rodei daqui, dali, arrisquei acessar uma, cinco, dez vezes... Nada!
Desconfio que alguém do bairro faz exercícios caseiros de mau-caratismo, pois a coisa acontece sempre às mesmas horas da tarde. Já constatei isto; ao que tudo indica, o trampicola dorme a manhã inteira, descansa, e recomeça as travessuras após almoçar. É um babaca.
Ainda agora antecipei-me ao fulano; pluguei-me antes dele iniciar a sessão de pilantragem.
...Mas, toda aquela inspiração matutina de anteontem, foi-se (e com ela a irritação, felizmente).
(...)
É impressionante a capacidade que temos de nos contrariar. Por mínima coisa nos contrariamos, ficamos azedos.
Lembro de minha avó materna e seu pedaço de pão. Ela jamais comia pão fresco. Nós o comprávamos para o café da tarde e antes de qualquer um de nós ela o cortava, tirava uma pequena fatia da parte interna e a guardava no guarda-louças, para ser consumida no dia seguinte. Dizia que de um dia para o outro a fermentação se completava e a digestão ficava fácil.
Nunca esqueci. Tenho minhas birras, tenho minhas contrariedades, minhas... fermentações. Às vezes (não muitas vezes) consigo deixá-las no meu guarda-louças, suportá-las, sem explodir. Vou dormir e no dia seguinte, tudo está bem, a fermentação já ocorreu e a digestibilidade, garantida, sem problemas.
...Realmente, como se diz, "o travesseiro é bom conselheiro"; e eu acrescento: é como um bom licor que auxilia a digestão.
(...)
Nesses dias de "fazer nada, mas, só nadar" (e nado um pouco melhor que pessimamente!) conheci um homem e sua família, na praia.
Todo dia eu observo pai e filha. Todo dia eu os encontro na praia fazendo a mesma coisa.
Moram longe, a quinhentos quilômetros. Mas todo ano voltam aqui, para o banho de mar. Desde o tempo em que o pai levava a filha nos braços, para o encontro com as ondas.
Naturalmente, a filha cresceu. Naturalmente, ele já não consegue levá-la nos braços... São vinte e quatro anos, fazendo a mesma coisa. Portanto, de há muito ele a leva nos ombros.
...E todo dia eu os encontro sorrindo, aproveitando as belezas da vida:
...ao pai não parece pesar, a cruz; pois que a filha, deficiente, jamais foi cruz para ele...
... - e isto se lê nos sorrisos que ambos estampam nos rostos, quando vão se dirigindo de encontro às ondas, ela no ombro dele;
...sorrisos que se corroboram;
...de cumplicidade;
...sorrisos de quem verdadeiramente se ama.
(...)
...E ficamos eu, muitos de vocês, nós todos, enfim - que temos nossos braços perfeitos, nossas pernas perfeitas, nossas cabeças perfeitas - a resmungar por coisinhas, a reclamar de possíveis contaminações por viroses internéticas!...
...Pílulas!
...Vamos todos tomar banho!
... - de mar, preferentemente.
(...)
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...Reclamar por quê? Reclamar de quê?
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Fev.23, 2013